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Articulação versus Fragmentação do Conhecimento

Articulação versus Fragmentação

É lugar comum a afirmação que o Brasil enfrenta grave crise econômica e política. Soluções as mais diversas são propostas, desfeitas ou logo em seguida abandonadas, como as desonerações do sistema produtivo efetuadas há cerca de dois anos e agora anuladas pela Medida Provisória 669 ou os vai-e-vem à respeito da CPMF. Mas o que raramente é abordado de modo responsável são as causas dessas crises, na maioria das vezes atribuídas a "fatores externos". Aliás, o processo de identificar as causas das crises como "fatores externos" carrega implicitamento o reconhecimento da inabilidade para controlar e influenciar os fatores de risco que desencadeiam tais crises com foco em objetivos claramente delineados que, no caso das crises, são a manutenção da prosperidade e bem estar econômicos.

No Brasil, os problemas são em geral enfrentados de modo reativo. Soluções "ad hoc" são propostas aos problemas que surgem e, muitas vezes, com elevados custos evitáveis se houvesse comportamento proativo, ou seja, a capacidade na previsão de problemas e adoção de medidas aptas a evitá-los ou mitigá-los. Mas como se desenvolve a capacidade de previsão de riscos?

Para além da adoção de tecnologias de ponta como ferramentas na solução de problemas encontra-se um fator de baixíssimo custo, acessível por todos, mas que exige aquilo que os inovadores norte-americamos denominam "hard work" e que não significa apenas "trabalho duro" em uma tradução literal, mas engajamento, controle, domínio e criatividade. Ou, de forma bastante singela, ideias e ações articuladas.

A noção de ideias e ações logicamente articuladas não é recente. Jean Piaget, criador da epistemologia genética, um modelo de desenvolvimento cognitivo a que todas as pessoas estão submetidas, identifica o quarto estágio do desenvolvimento intelectual com o surgimento da habilidade de execução mental de operações sobre fatos e objetos do mundo físico voltadas para o alcance de determinados objetivos. Implicitamente, ao estabelecer que as operações são mentais, portanto sem materialidade física, e tem por base fatos e objetos empíricos, estamos diante do desenvolvimento da habilidade de planejamento e previsibilidade de resultados. Por as operações serem mentais, a experimentação e validação de diferentes possibilidades que conduzam aos resultados desejáveis são possíveis.

Oposta à articulação das ideias para solução de problemas temos o modelo de aprendizagem fragmentado. Este é o modelo, implicitamente, adotado na maioria das escolas brasileiras. Por ele, o aluno aprende conceitos pela memorização, mas não desenvolve adequadamente a capacidade de correlacionar conceitos para a solução de problemas corriqueiros no cotidiano. Piaget identificou a memorização como estratégia cognitiva e a associou ao terceiro estágio de desenvolvimento cognitivo, em que a pessoa consegue resolver problemas desde que perceptívies em sua materialidade concreta. No Brasil, o Instituto Paulo Montenegro, na pesquisa e mensuração das habilidades e práticas de leitura, escrita e cálculos aplicáveis ao cotidiano entre a população brasileira na faixa de 15 a 64 anos (INAF - Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional), aponta que aproximadamente 65% dessa população não desenvolveu suficientemente tais habilidades. Ou seja, pode ter memorizado conceitos, mas não sabe contextualizá-los e aplicá-los no cotidiano de suas existências.

Uma demonstração de que, via de regra, a escola brasileira, seja pública ou privada, incentiva a memorização pode ser verificado no método avaliativo, em que as questões não são interdisciplinares e muitas vezes concentram-se na definição de conceitos sem explorarem suas aplicabilidades para além do contexto específico em que são ministradas. Se assim não fosse, os indicadores de alfabetismo funcional do Instituto Paulo Montenegro recém citados não retratariam uma realidade tão desanimadora. Se a pessoa não correlaciona conceitos, a habilidade de planejamento e previsibilidade de resultados inexiste; se inexiste planejamento, a capacidade de inventar o futuro e prever riscos, necessários a proatividade, inexiste; se inexiste proatividade, o pleno desenvolvimento econômico e social, em contextos de competitividade econômica, inexiste; se inexiste pleno desenvolvimento econômico e social ... permanecemos estagnados no padrão de vida já alcançado ou retrocedemos em relação às nações mais desenvolvidas, com crises quando a razão necessidades materiais / crescimento econômico rompe determinados limites.

Neste ponto do texto, é esclarecedor retomarmos a ideia de "hard work" acima exposta: seu sentido é de que a pessoa deve compreender as necessidades do contexto competitivo que vivemos e aceitar e que o incremento nas habilidades intelectuais e cognitivas não ocorre de modo natural, como supõem muitos profissionais da educação que professam uma determinada forma de "cognitivismo" inato e que, indiretamente, possuem responsabilidade nos índicadores negativos da educação (os dados do MEC expressos na Avaliação Nacional de Alfabetização 2014 indicam que 56,17% dos estudantes brasileiros no 3º ano do ensino fundamental têm baixo nível de leitura). As formas adequados para o desenvolvimento cognitivo passam pela análise fria dos dados (e não das crenças), com a identificação individual das inabilidades e, racionalmente, o estabelecimento de planejamento para superar tais deficiências.